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O que significa sonhar que encontrou uma vaga de estacionamento?

Por George dos Santos Pacheco
15/10/25 - 12:22

"Se sonhar um pouco é perigoso, a solução não é sonhar menos é sonhar mais." (Marcel Proust)

"Ora, se não é minha eterna rival, a infame vaga de estacionamento, aquela que nunca está acessível quando eu preciso…", pensei ao chegar na Farinha Filho. Franzi o cenho e reduzi a marcha, acelerando para emparelhar com o carro da frente. Volante para boreste, toda máquina a ré… ora, doce ilusão. Precisei frear, de súbito, ao avistar pelo retrovisor um motorista que entrava de frente mesmo, já com o veículo pela metade na vaga. Baixei o vidro, acenei com a mão, mas o tal sujeito estava inflexível e irredutível. Nada de conversa. E embora eu salivasse, ia ficar ali discutindo por vaga de estacionamento? Não, não ia. Contrariado, arremeti.

Parei no sinal, fulo, xingando entre os dentes. Putzgrila, terráqueo. A presença da sombra fantasmagórica de uma prosaica área para estacionar me persegue dia e noite, até quando ela não se faz necessária. Sonhar não custa nada, não é?

Verde. Engatei a primeira, seta para a esquerda. Benzi-me em frente à Matriz e me peguei correndo o olhar pela beira da calçada. Uma vaga! Reduzi a velocidade e me aproximei, entretanto, a placa indicava um local reservado para idoso. Justo, muito justo. Estalei os lábios, num muxoxo. Fazer o quê, né? Vamos continuar nossa jornada… afinal, encontrar uma vaga de estacionamento público em Gotham City é uma arte ancestral quase desconhecida.

Em velocidade constante de 30 km/h na Alberto Braune, até a altura da Duque de Caxias, todas as opções possivelmente disponíveis estavam ocupadas, ou por funcionários do comércio, ou por moradores dos prédios do entorno, por motos, carrinhos de recicláveis, carros de "entrega rápida". As demais eram destinadas a deficientes físicos, idosos, farmácias (justo, muito justo) e mais uma renca de locais para "carga e descarga". Bufei. Por que causa, motivo, razão ou circunstância há tantas áreas para o serviço? Por que não se realiza a carga e descarga durante a madrugada?

Virei a Duque de Caxias e depois a rua sem nome "atrás do ABC". Carga e descarga, carga e descarga, mais carga e descarga. Puta-que-pariu. Cruzei a Fernando Bizotto e virei na Oliveira Botelho, retornando para a Alberto Braune. Ali, o terço final era totalmente destinado a táxis, assim como em metade das ruas da cidade. Nota pertinente: havia apenas dois carros parados. Coloco o carro num estacionamento privado? Jamais! Isso agora é questão de honra!

Retornei novamente na Duque de Caxias, freando na confluência das transversais, os olhos agudamente fixados, a dardejar retos em busca das preciosas vagas para estacionar. Precisei desviar diversas vezes de veículos parados em fila dupla – e até tripla – com os pisca-alertas ligados ou não. Mais motos ocupando espaços inteiros, mesmo que não fossem destinados para elas. Agora, vá você ocupar uma área de motociclista para ver?

Augusto Cardoso, Rua do Bolero. Virei à direita, quem sabe agora? Eu estou até longe do meu compromisso, mas se encontrar uma vaga, eu vou a pé, nem que seja para pagar promessa. Fila dupla, fila dupla… motos e mais motos, quase ombro a ombro. Volto para a Alberto Braune? Não, melhor contornar pela praça.

Eu sei o que está pensando, inconformado leitor. Por que o teimoso cronista não paga logo um estacionamento e conclui de vez a crônica? Por que essa obsessão quase patológica? Por que essa paranoia, essa monomania por um lugar para deixar o carro? Simplesmente porque não encontrar uma singela vaga de estacionamento na minha cidade me faz um mal danado, me dá azia, enxaqueca, gastrite, dores nas juntas. Para mim, ela é um bem público inalienável, ao qual eu tenho direito como a outro qualquer. Só por isso, cara pálida.

Dito isto, prossigamos. Vagas para táxis, trailers de fast food, motos, farmácias containers de lixo, carros de entrega rápida, carga e descarga… táxis, táxis, táxis. Ora, decerto eu é que estou errado: as vagas existem, mas não para mim, cidadão comum. "Talvez seja o caso de eu vender pastel e caldo de cana, estaciono o carro e ainda pago as contas na lotérica…", refleti pesaroso. Eu já estava na altura da Estação Livre, desesperançado. Esquerda e direita, segui para retornar ao centro da cidade. O senhor tem razão, paciente leitor, melhor pagar mesmo, o orgulho só me faria perder o compromisso e com isso a reputação de sujeito pontual e respeitoso. Foi aí que lembrei: eu bem que precisava comprar algumas coisas no Cavalo Azul, e ali em frente tem algumas vagas de curta duração. Quem sabe se… ora, se não é minha eterna rival, a infame vaga de estacionamento!

Coloquei o carro, liguei o pisca-alerta e parei por instantes na calçada, mirando orgulhoso para o carro parado. Passei cerca de vinte minutos fazendo as compras, feliz da vida com a recente conquista; vou até tomar uma cerveja ao chegar em casa só por causa disso! Encontrei uma vaga, ô, rapá! Conferi a lista da Dona Maria, fui para o caixa, paguei, agradeci e recusei o carregador, afinal, o carro estava ali, pertinho, pertinho. Quando retornei, com sacolas em ambas as mãos, precisei passar de lado e encolher a barriga nos retrovisores. Abri a porta com cuidado, mas com o corredor estreito, ela acabou esbarrando a extremidade no carro do colega.

"Ei, cara! Você precisa ter mais cuidado quando abrir a porta!", esbravejou ele, dando ré no veículo e emparelhando com o meu. "Você precisa ter mais cuidado, cara!", repetiu o sujeito, num tom ameaçador e belicoso. Suspirei e limitei-me a pedir desculpas. A porta bateu, não é? Leve ou forte, ela bateu. "Me desculpe…", eu disse, e ele manobrou o carro, cantando pneus ao arrancar.

O que significa sonhar que encontrou uma vaga de estacionamento? Pode ser uma experiência reconfortante e carregada de significado; segundo Freud, os sonhos são a manifestação de desejos reprimidos e conteúdos inconscientes. Aqui em Friburgo, sonhar que encontrou uma vaga de estacionamento é apenas um sonho, nada mais.


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