O espelho mágico
Certa vez eu li... reparou que alguém sempre começa um papo assim? Ninguém diz "ah, fiquei sabendo na fila do pão", "no posto de saúde"... É sempre um tal de "li num livro”, "minha vó já dizia"... Quanto mais a fonte da informação nos parecer confiável, mais credibilidade ganha o argumento, método, aliás, utilizado há tempos por contadores de histórias e afins.
Para se ter uma ideia, até nas redações de vestibulares se aplica essa técnica. A orientação e postura das bancas de correção exige que lá no meio do texto se introduza a citação de um autor que corrobore os argumentos do candidato, dentro do tema do trabalho. “Assim falou Zaratustra..."
O problema é que frequentemente o aspirante à faculdade coloca um excerto que nada tem a ver com a proposta, daí fica uma conversa de maluco em que ninguém se entende.
Ah sim, justamente. Eu ia dizendo que, certa vez eu li – e agora já nem importa onde foi – que numa conversa (entenda bem caro terráqueo. Diria o Bruxo, “palavra puxa palavra, uma ideia traz a outra, e assim se faz um livro, um governo ou uma revolução”. Ora, assuntos são entidades com vontade própria que se interligam a outros quando bem querem. O condutor é quem precisa ser firme e conduzi-los com foco, como um cavalo arredio, nem que seja por suas crinas)...
Não é assim?
Como naquelas reuniões de escola, de condomínio, de trabalho, em que, no fim das contas, ninguém sabe de onde veio, tampouco para onde vai, justamente porque os cavaleiros não tem domínio de seus alazões. É um saco. Odeio reuniões.
Enfim, controle sobre o pangaré, Pachecão. Agora sim. Certa vez eu li que, numa conversa, se esta descambar para uma discussão, o melhor a fazer é abaixar o tom de voz, porque o interlocutor belicoso, será obrigado a também abaixar o tom de voz para nos ouvir e voici (!) fim de discussão. O nome disso é Espelhamento, uma técnica para o estabelecimento do Rapport, um conceito da Psicologia que significa uma “estratégia usada para criar uma ligação de sintonia e empatia de uma pessoa para outra”, conforme esclarece Dra. Simone, minha terapeuta. Id, Ego e Superego agradecem.
Essa técnica é muito utilizada na área de vendas para criar uma afinidade entre o vendedor e o possível consumidor, ou na área empresarial, entre chefes e colaboradores. No caso específico desta minha logomania quinzenal, primeiro você cria o comportamento desejado, para depois ele ser replicado por outrem.
Terráqueos do meu coração. Pri-mei-ro. Isso significa dizer que nessa (e na maioria de situações em nossas vidas) se esperamos uma espécie de atitude de nosso interlocutor ou parceiro, nós é que devemos tomar a dianteira e assumir a conduta almejada. Para ilustrar melhor, é muito comum me perguntarem como estimular o hábito de leitura nos filhos, ao que eu respondo “sendo leitor, oras!”. Espelhamento puro e simples.
O controle, as rédeas, o timão, sempre estiveram em nossas mãos e isso é tão claro como a água. Mas se isto é um conceito tão cristalizado, por que nos custa tanto pô-lo em prática?
Somos orgulhosos demais.
Sempre buscamos impor nossos assuntos, opiniões, filosofias, doa a quem doer. E a ideia de assumir uma postura humilde perante o coleguinha, em contextos que nos julgamos certos (quase sempre né?), nos incomoda. O outro que mude, afinal.
É preciso ser a mudança que se deseja. Espelhamento, puro e simples, meus caros.
Para concluir, a verdade é que... não me lembro onde foi que tomei conhecimento disso, se li num livro, se ouvi na igreja, num churrasco ou no boteco. Mas agora você pode dizer que leu numa crônica.
O Portal Multiplix não endossa, aprova ou reprova as opiniões e posições expressadas nas colunas. Os textos publicados são de exclusiva responsabilidade de seus autores independentes.